Escrita Cafeína

19 de set de 2021

Nacional Jornal

O caminhão do frigorífico
 
parou nos fundos do
 
hospital. Uns mortos
 
cedem lugar a outros mortos.

Uns mortos, aqueles,
 
passaram por nossa
 
geladeira, panelas e
 
acabaram fumegando

sobre a mesa.

Têm sorte os outros: agora
 
repousam no caminhão frigorífico,
 
à espera de caixão e transporte
 
até o destino de onde vieram.

Não estão, como esses daqui,
 
empilhados em salas repletas,
 
fedendo ao ar livre
 
ou jogados sobre macas,
 
vizinhos de quem sufoca sua hora.

Mal embalados (esses daqui)
 
em lúgubres sacos plásticos cinzentos,
 
pés à mostra, sozinhos

pingam suas excrescências,

seu criatório de infecção.

(No céu, rondam urubus)

Jorge Claudio Ribeiro

    4