Quando nasci, minha única posse era um pequeno pássaro branco, que eu levava sobre a cabeça. Ele me mostrou mil portas e janelas, em jardins e em palácios, de madeira e de ouro, a leste e a oeste. Era-me o melhor amigo. Levava-me voando para trás do horizonte e me mostrava o avesso das auroras.
No entanto, logo alcancei os quinze anos de existência, um anjo triste me procurou com a oferta de uma estrela de sangue. Em troca, queria meu passarinho. E o teve. Mas foi à luz dessa estrela que semeei as mais belas flores, as mais incendiárias heras. Foram-me os anos mais férteis, mais sábios, insanos.
Enfim alcancei os dezoito, e em seguida um lugar na Universidade. Na livraria do campus, busquei o volume sugerido por uma professora. E o encontrei. Mas o preço foi minha estrela, pela qual obtive o livro de Cálculo. De brinde, ganhei um maço de cinzas, que levei no peito, a ocupar o aposento recém esvaziado.
Pedro Guerra Demingos
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